sábado, 3 de julho de 2010

1. Introdução

O desenvolvimento do ser humano está intrinsecamente ligado aos tipos de energia que ele teve acesso. Como comentado por Fernandes (1999), o domínio sobre o fogo foi o primeiro grande passo para a humanidade. Na época o combustível existente era somente a lenha. Mais tarde começou o uso do carvão vegetal, um combustível mais compacto se comparado com a lenha.

Com estes energéticos, que até hoje são utilizados, o Homem deu início à metalurgia, industria básica para o desenvolvimento da agricultura, todo tipo de artesanato, armamentos, construção civil, transporte, etc.

O primeiro metal a ser trabalhado foi o bronze, mistura de cobre com estanho. Depois veio o ferro, mas o que viabilizou a metalurgia deste foi o uso do carvão mineral. Aliás, o carvão mineral foi o combustível que impulsionou a revolução industrial. Foi com ele que as máquinas a vapor funcionaram e, através delas, o Homem conseguiu produzir em grandes quantidades produtos manufaturados, como tecidos, ferramentas, outras máquinas, etc. Foi também através das máquinas a vapor que o Homem reduziu o tempo de deslocamento entre cidades e nações, através dos trens e navios. É importante notar que a Inglaterra, berço da revolução industrial, tinha muito carvão mineral e minério de ferro.

Com o carvão mineral foi possível produzir um gás, conhecido como gás manufaturado, através do craqueamento deste. Este gás, rico em hidrogênio, permitiu as primeiras instalações de iluminação pública e depois o seu uso nas residências em fogões e aquecedores de água. Este tipo de utilização só foi possível com um gás, que era uma extensão do uso do carvão.

Entretanto, segundo Martin (1966),o gás manufaturado foi deslocado completamente da iluminação pública com a descoberta da energia elétrica no século XVIII. Além de ocupar o espaço do gás na iluminação pública, a energia elétrica passou a ocupar também espaço do carvão em outros processos industriais. A energia elétrica é mais nobre do que o carvão, pois sua conversão em outra forma de energia é conseguida de forma muito eficiente.

Já no final do século XIX outro energético surge para mudar o mundo: o petróleo com o uso de seus derivados. A infinidade de variações de hidrocarbonetos, permitindo diversos tipos de combustíveis gasosos e líquidos, além de outros que permitiram a indústria do plástico. Rapidamente surge a indústria automobilística, que anda em rodovias, feitas com asfalto, sub-produto da destilação fracionada do petróleo.

Século XX, início do uso em escala do gás natural. Seu início foi nos EUA, mas com as exportações da Rússia, com a maior reserva do planeta, o gás natural tomou espaço do carvão nas termoelétricas e do gás manufaturado fornecido para as residências na utilização em fogões, aquecedores e calefação.

Hoje o gás natural se tornou mundialmente o energético mais utilizado em termoelétricas e é o energético que mais cresce em utilização.

Outro combustível do século XX é o nuclear, inicialmente fonte de energia para as bombas atômicas, teve sua utilização como combustível em usinas termonucleares. Muitos países utilizaram esta forma de energia, como os EUA, França e Alemanha. Hoje, seu futuro está sendo repensado.

Esta sinopse, do descobrimento e utilização dos energéticos de nosso globo, traz os elementos iniciais para o trabalho que se segue. Estaremos trazendo este cenário mundial descrito para nosso país, somando suas particularidades, potenciais e influência na indústria nacional.

2. Histórico da Matriz Energética Brasileira

Desde a descoberta, o Brasil utiliza a lenha como energético. O ciclo da cana de açúcar se desenvolveu todo ele sustentado pela lenha. O caldo de cana era aquecido em tachos de cobre, utilizando lenha.

O ciclo do ouro, que veio em seguida, também foi calcado no uso da lenha. O ouro em pó era derretido em fornos a lenha/carvão vegetal, assistidos com foles, para se obter as temperaturas necessárias.

O ciclo do café, foi o primeiro que trouxe o uso do carvão mineral, não porque a torrefação necessitasse.Mas o dinheiro proporcionado pelo café, aliado a presença de imigrantes que trouxeram uma massa crítica de conhecimento, aliado ao mercado brasileiro que demandava cada vez mais produtos utilizados na Europa, desencadeou os primeiros passos da industrialização do Brasil, particularmente na cidade de São Paulo. O carvão, além da energia mecânica gerado pela rodas d'água, foi o grande responsável O carvão passou a substituir também a lenha nas locomotivas a vapor. Foi o responsável pelo início da indústria de gás manufaturado do Rio de Janeiro e São Paulo.

Descrito por Martin (1966), este carvão era importado da Inglaterra principalmente e dos EUA. A produção nacional de carvão começa apenas em 1912.

Esta dependência do carvão importado entra em crise com a primeira guerra mundial entre 1914 e 1918 e continua nos anos que se seguiram devido à reconstrução da Europa. É importante notar que a produção industrial mundial pode ser correlacionada nesta época com o consumo deste energético.

Em paralelo, o desenvolvimento proporcionado pelo café trouxe investidores externos e internos para a geração de energia elétrica. Entre 1901 e 1930 houve um aumento de 15,6% da capacidade instalada

A importação de petróleo e derivados era desprezível até o fim da primeira guerra mundial. As importações triplicaram logo após e se mantiveram assim até 1923. A partir de 1924, as importações começam a crescer consistentemente, salvo alguns anos de queda. Este crescimento coincide com o crescimento do uso de automóveis e caminhões.

Em 1929, com a quebra da bolsa de New York, nova crise se instalou. No Brasil a repercussão foi imediata, pois a base de sustentação da política "café com leite" era o café. Com a instalação do governo de Getúlio Vargas em 1930 começa uma fase desenvolvimentista que permanece até 1980, conforme Santos (2004).

Esta fase se caracterizou por um governo forte, centralizador, intervencionista, nacionalista e populista. Caracterizou-se como sendo a fase onde o Brasil obteve o maior crescimento em sua economia. Crescimento este calcado na industrialização, na urbanização, na expansão das rodovias, das telecomunicações, da indústria de base.

O Código de Águas criado em 1934 deu o caráter centralizador do governo, dando à União a posse de todo o recurso hídrico nacional. O Código aboliu a Cláusula Ouro dos antigos contratos de concessão de eletricidade. A partir de 1941 passou a vigorar uma nova regulamentação econômica para o setor, através da qual a tarifa máxima passava a ser determinada pelo "custo do serviço". De acordo com ELETROBRAS (2004), o capital seria remunerado em média a 10% ao ano. Porém, estabeleceu-se o princípio do custo histórico do serviço, isto é, os custos deveriam ser calculados em valores nominais passados, sem cláusulas de correção inflacionária ou cambial.

Em 1953, devido a uma estação de seca grave, o país foi obrigado a adotar um racionamento de eletricidade, em uma época conturbada politicamente, que culminou com o suicídio de Vargas em 1954. Segundo Bermann (1991), o ano de 1955 é considerado um marco no Brasil da intervenção direta do Estado na geração de eletricidade, com a entrada em operação da primeira máquina da usina hidrelétrica de Paulo Afonso.

As relações entre empresas privadas e estatais já ocorriam desde o final do século 19, sempre pautada por controvérsias, sendo as mais fortes: a natureza da atividade de prestação de serviços públicos de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica; a presença de empresas estrangeiras e as formas de remuneração do capital através das tarifas.

No início do século 20, aproveitamentos hidrelétricos de vários portes e locais foram passados para o controle de duas empresas: AMFOP (pela sua subsidiária EBASCO) e a LIGHT, que foram estatizadas em 1964 e 1979, respectivamente, em condições vantajosas para estas empresas.

A partir dos anos 40 várias empresas estatais foram criadas, sendo duas na década de 40, nove na de 50, dez nos anos 60 (sendo que em 1966 a criação da CESP absorveu várias empresas estatais), duas nos anos 70, sendo uma delas, a ITAIPÚ, binacional (Brasil/Paraguai), com 96% da energia destinado ao Brasil.

Nos anos 50, três fatores marcaram a inserção do Estado no setor elétrico: a criação da ELETROBRÁS, a instituição do "Plano Nacional de Eletrificação" e a criação do "Fundo Federal de Eletrificação".

Estes dois últimos parágrafos mostram o vigor e a amplitude com que a estatização ocorreu no setor elétrico Brasileiro.

Um ponto comum que caracteriza principalmente concessionárias que tinham atividade de distribuição, geração e transmissão de energia elétrica é que cada empresa criada correspondia um determinado aproveitamento hidrelétrico, cujas obras eram de responsabilidade específica da concessionária.

Outro ponto comum é que estas empresas estatais de caráter estadual foram criadas precedidas pela institucionalização de uma taxa de eletrificação, para capitalizar e viabilizar o programa de eletrificação nos estados. Esta taxa, junto com os recursos provenientes do IUEE - Imposto Único de Energia Elétrica (institucionalização do "Fundo de Eletrificação"), federal, concedido mediante apresentação do "plano de eletrificação" do estado; consistia uma forma vigorosa de arrecadação de recursos para as concessionárias. Entre 1954 e 1961, o agente de mobilização desses recursos foi o BNDES. Durante esse período o setor elétrico representou de 40 a 60% dos investimentos totais do Banco. A partir de 1962 a Eletrobrás passou a ser o principal destino desses recursos, transformando-se na grande instituição financeira do setor. O acesso a tais fontes de financiamento baratas permitiu a estrondosa expansão do setor, através de empresas estatais.

A apresentação do "plano de eletrificação" enfatiza a importância do papel das estatais no planejamento dos aproveitamentos energéticos para fins elétricos, em substituição ao planejamento de empresas privadas concorrentes, que seriam incapazes de "racionalizar e otimizar os aproveitamentos", principalmente os da mesma bacia hidrográfica.

Em paralelo, foram mantidas diversas empresas privadas possuidoras de usinas de pequeno porte, dedicadas à distribuição ao cliente final. Foram concedidas a grupos industriais as gerações para próprio consumo.

A ELETROBRÁS controlava um "holding" de seis empresas e tinha participação nas outras estaduais e privadas chamadas de coligadas.

Desta forma, em termos de capacidade instalada (data do levantamento 31/03/1990):

· Empresas Controladas 23.237 MW (43,9%)

· Empresas Coligadas 16.456 MW (30,3%)

· Itaipu 10.500 MW (19,4%)

· Auto produção + privadas 3.487 MW (6,4%)

TOTAL 54.237 MW (100,0%)

Pelo fato de muito se ter investido na construção do parque nacional de hidrelétricas, o governo brasileiro fomentou o uso da energia elétrica, para amortizar os investimentos feitos. Isto direcionou o sistema produtivo a utilizar equipamentos de geração de calor e vapor elétricos.

No petróleo, não foi diferente. Em 1934 o governo criou o Código de Minas, situação que perdurou até 1938 com a Lei nº 395 que criou o Conselho Nacional do Petróleo (CNP). Esta lei decretava que todas as atividades petroleiras eram de utilidade pública, as quais deveriam ser regulamentadas pelo CNP. O Estado, através do CNP, controlaria as atividades de refino, prospecção e exploração das jazidas de petróleo.

Com a segunda guerra mundial a rigidez nacionalista em relação ao petróleo foi relaxada, de acordo com Santos (2004). As descobertas na Bahia atraíram o interesse de empresas estrangeiras. Contudo, com o fim da guerra, o petróleo assumiu um papel ainda mais estratégico na economia global. Surgiu uma nova onda nacionalista, que propiciou a criação da Petrobrás em 1954, por Getúlio Vargas, herdando todo os ativos produtivos do CNP, principalmente 232 poços de produção e 361 de exploração. Em menos de dez anos, a Petrobrás instalou uma capacidade de refino equivalente ao consumo de produtos petroleiros do país. O Brasil livrou-se da dependência de produtos derivados e passou a importar óleo bruto. A produção nacional de petróleo aumentou muito e representou 1/3 do consumo total do país em 1960.

Foi fundamental para a consolidação da Petrobrás a modificação ocorrida no sistema de financiamento do setor de petróleo. Quando a empresa foi criada, foram disponibilizadas quatro fontes de recursos fiscais: um imposto sobre automóveis importados; uma contribuição anual de proprietários de automóveis, avião ou barco (onde se entregava um certificado que poderia ser trocado posteriormente por ações preferenciais da empresa); uma contribuição especial paga por todas as demais empresas de petróleo operando no mercado nacional; e finalmente uma fração de um novo Imposto Único sobre os Combustíveis (sendo que a outra fração desse imposto seguia para um fundo que financiava investimentos na área de transporte, na ampliação da infra-estrutura que permitia o uso de veículos e o consumo de combustíveis). Apesar desta fonte de recurso ter sido importante no início da Petrobrás, não eram suficientes para que ela realizasse seus inúmeros investimentos. Muito mais importantes foram os recursos próprios da empresa que, em três anos, passaram a contribuir com parcelas de 50, 70 e 90% do financiamento total.

Na indústria, a era Vargas trouxe a siderurgia (CSN) na negociação com os EUA e a Vale do Rio Doce na exploração do minério.

Nos anos 50 e 60, devido aos investimentos estatais, o setor energético também se industrializou. As áreas de petróleo, hidroeletricidade e carvão adquiriram dimensões de indústria, somando os esforços do governo na construção de indústrias de base e infra-estrutura. A era desenvolvimentista prosseguiu com Jucelino e seu plano de metas, desenvolvendo a indústria nacional e reduzindo a dependência brasileira da exportação de commodities agrícolas e minerais.

A instabilidade da moeda gerado pelos excessivos gastos governamentais, principalmente com a construção de Brasília, provocaram um aumento da inflação. Juscelino rompeu com o FMI, que exigia austeridade fiscal. Esta retomada só se deu em 1964, com o governo militar arrochando os salários e gastos públicos e aumentando a participação dos tributos no PIB de 16,3% para 22,4% entre 1964 e 1967, reduzindo com isso uma inflação de 87%aa para 24%aa no mesmo período. O crescimento econômico caiu para taxas de 3,6% neste período, mas rapidamente cresceram na seqüência a taxas de muito altas. Entre 1968 e 1973 o PIB cresceu em média 11,5%aa, enquanto a inflação foi reduzida de 25,4% para 15,5%. O crescimento foi maior nas indústrias de bens de consumo duráveis, de equipamentos de transporte e em indústrias de base como o aço, cimento, e a geração de eletricidade. Além disso, foram criados instrumentos de financiamento da casa própria, cujo efeito foi dar um grande impulso na construção civil.

O fator responsável pela grande penetração do petróleo no mercado nacional e mundial era o preço. Um grande impacto se deu na economia nacional e mundial quando a OPEP aumentou significativamente o preço em 1973. O mundo reagiu de diferentes formas. O Japão, por exemplo aproveitou a importação do petróleo para alavancar suas exportações, negociando com seu dinheiro. No Brasil, os militares que estavam no poder desencadearam os seguintes ações e programas:

· A prospecção e extração de petróleo em águas profundas;

· A intensificação da construção de hidrelétricas para reduzir a dependência do petróleo na indústria;

· A associação com a Alemanha de repasse de tecnologia nuclear, resultando na construção de Angra 1 e Angra 2 e compra dos principais itens de Angra 3;

· O Pro-álcool, maior programa mundial de sucesso em renováveis.

Estes esforços foram possíveis através do endividamento do governo, em financiamentos a juros baixos de dinheiro oriundo do próprio petróleo. Outro choque se deu em 1979, houve um aumento dos juros das dívidas em dólar e a economia brasileira entrou em uma espiral inflacionária, onde somente conseguiu sair com o Plano Real, iniciado no governo de Itamar Franco.

No governo de Fernando Henrique, com forte tendência neoliberal, se deu a privatização de várias estatais, principalmente no Estado de São Paulo. Toda a distribuição de energia elétrica e gás canalizado foi privatizada.

De qualquer forma, a privatização se deu sem haver um marco regulatório bem definido e visou o maior retorno para o caixa do governo. A falta de regras claras e de definição das responsabilidades dos atores ocasionou a crise de energia elétrica de 2001. Houve uma queda de cerca de 20% no crescimento esperado da economia, em uma época onde se aguardava a retomada de um crescimento sustentável. Situação vivida até hoje.

Porém é importante ressaltar que antes da privatização das distribuidoras de gás canalizado, uma decisão governamental, processada pela Petrobrás, criou o gasoduto Brasil-Bolívia, fato que evidencia a liderança do Estado na definição de um panorama novo para a matriz energética nacional.

3. Matriz Energética, a Situação Atual Brasileira

O primeiro detalhe importante a ser observado, a título de esclarecimento, foi à mudança ocorrida no cálculo da matriz energética em 2003. Antes, a parcela da energia elétrica era calculada considerando que toda a produção era devido a termoelétricas com eficiência termodinâmica de 32% e assim era considerado o consumo de combustível fóssil neste contexto. Isto produzia uma distorção do valor da energia elétrica, de forma que a matriz era dividida basicamente em 1/3 energia elétrica, 1/3 derivados de petróleo e 1/3 outros energéticos. Hoje, com o ajuste feito, fica mais fácil comparar nossa matriz com a de outros países, pelo fato do Brasil adotar os mesmos parâmetros de comparação.

É importante lembrar aqui que a matriz não pondera sobre a qualidade da energia, ou seja, não existe uma ponderação para compensar a energia elétrica da sua capacidade em se converter em outras formas de energia, com pequenas perdas, comparada com outros energéticos.

Hoje o Brasil tem a seguinte situação se comparado com o resto do mundo (vide tabela 1 abaixo), BEN (2004):

Tabela 1. Energia: Brasil x Mundo

Energia

Brasil (%)

Mundo (%)

Petróleo e Derivados

Biomassa

Eletricidade

Gás Natural

Carvão

43,2

27,2

13,6

7,5

6,6

34,9

11,5

2,3

21,0

23,5

Urânio

1,9

6,8

Com relação ao gás natural, o mesmo está sendo utilizado segundo (vide tabela 2 abaixo), BEN (2004):

Tabela 2. Gás Natural no Brasil

Utilização

(%)

Indústria

Reinjetado/Flair

Geração Elétrica

Automotivo

Não Energético

42,7

26

14,4

4,7

3,6

Outros

8,6

4. Uma Visão Futura para a Matriz Brasileira

Consumidor com poder de escolha, flexibilidade, oferta de várias fontes de energéticos. Esta talvez seja a vertente mais desejada para o consumidor final, que poderá escolher qual o energético mais razoável segundo uma relação de custo/benefício.

A tecnologia do flex fuel é um exemplo concreto desta tendência. Um carro bi-combustível, onde tem o incentivo do carro a álcool nos impostos, a opção de se escolher álcool ou gasolina e a virtude de não perder o valor na revenda, ou mesmo de não ficar vulnerável a falta de um ou outro energético.

Temos também a tendência do motor diesel com gás natural associado, que já foi desenvolvido e pode ter uma importante participação no mercado de ônibus municipais e geradores/co-geradores.

Temos, no setor industrial, a possibilidade de se usar o gás natural juntamente com óleo pesado em queimadores, onde o gás natural faz a vez do vapor para auxiliar na diluição e dinamização do óleo pesado.

Sinergia entre as diversas opções para os energéticos e em especial para o gás natural. É fácil de ver que a distribuição do gás natural liquefeito (GNL) e comprimido (GNC) irá alavancar o crescimento futuro do gás natural canalizado. A formalização da liberação do uso do GNL e GNC das esferas estaduais, fazendo uma legislação e regulação através da ANP, de vigência nacional tende a expandir o uso do gás natural para locais onde hoje é inviável o gás canalizado, formando a massa critica necessária para no futuro se dar à construção de dutos.

A sinergia deve se dar também nas diferentes políticas governamentais, de projetos antigos e novos, como o uso do gás natural veicular. Num país que produz excedente de gasolina e já tem um programa de sucesso que usa o álcool, utilizar o gás natural, com menos impostos, agrava este excedente. Um país com déficit de diesel deveria focar e fomentar a expansão do GNV para deslocar o diesel, com inúmeras vantagens, como a ausência de enxofre e conseqüentemente redução de chuvas ácidas nos grandes centros, com a redução de particulados, entre outros. O gás natural poderia ser uma grande ferramenta para reduzir a dependência do Brasil de petróleo, não somente pelo uso do GNV em lugar do diesel, mas com aplicações industriais do gás natural, na indústria gás química, em plantas de GTL (gas to liquid).

O gás natural é considerado o segundo energético mais nobre, sendo a energia elétrica o primeiro, de acordo com Santos (2002). Seu uso deve ser nobre também, pois nobre é seu potencial. A combustão direta se justifica quando desloca a energia elétrica do meio produtivo. Já foi comentado que os investimentos feitos nas hidrelétricas tinham que ser amortizados e por isso o governo fomentou o uso da energia elétrica nos processos produtivos, mesmo que fosse na geração de calor ou vapor. A indústria calcou seus processos produtivos encima disto. Existe, portanto, um grande potencial de uso do gás natural na queima direta, substituindo estes processos calcados no uso da energia elétrica.

Outros processos de queima direta que o gás deve ser utilizado são naqueles onde existe um valor agregado diferencial, como no caso da indústria de cerâmica branca, onde o gás natural deslocou o GLP, outro derivado de petróleo onde temos déficit.

O gás natural entra também na geração de energia elétrica como suporte ao sistema de hidrelétricas. Entra na época de seca prolongada, em picos, de forma a dar maior robustez ao setor elétrico nacional. Ele tem a vocação de ser usado em termoelétricas, mas não no Brasil que possui a hidrologia que tem. A co-geração é outra utilização nobre do gás natural. Desta forma, o setor elétrico deveria ver o gás natural como uma ferramenta complementar ao sistema elétrico atual.

Outro uso que pode ser fomentado, deslocando novamente a energia elétrica, é na refrigeração, ar condicionado e aquecimento de água residencial.

A Petrobrás deve e tem um papel fundamental na expansão do gás natural na matriz brasileira. Mas além da Petrobrás, o governo como um todo deve unir forças com todas as entidades formadoras de opinião para disseminar o uso do gás natural. Não temos uma cultura do gás no Brasil. Um exemplo claro disto é que engenheiros civis têm durante o curso de engenharia a disciplina de instalações elétricas e hidráulicas, onde não se fala em instalações de gás. Vários municípios não têm códigos de obra. Uma campanha nacional deveria ser feita para que as construções brasileiras contemplassem diversos tipos de energéticos, de forma a facilitar a penetração do gás natural neste seguimento.

O fomento que o governo pode dar não é mais a construção de grandes gasodutos, salvo raras exceções e salvo os gasodutos de integração regional, com nossos vizinhos. O grande fomento do governo deveria ser no desenvolvimento de uma indústria de equipamentos de uso final, através de redução de alíquotas, financiamentos facilitados e incentivos para se produzir no Brasil e assim reduzir nossa dependência externa.

O gás natural terá uma participação cada vez mais importante na matriz brasileira, pois novas reservas foram descobertas e muitas áreas propícias não foram verificadas. Além disso, nossos vizinhos já possuem grandes reservas, e o GN poderá ser uma excelente ferramenta de integração regional, intensificando o comércio entre Brasil, Bolívia, Argentina e Peru.

O gás natural é descrito por Santos (2002) com o combustível da transição. Transição esta de um mundo com uma cultura do petróleo, para outro mundo com uma cultura com usos de energéticos alternativos e sustentáveis. Existe o exemplo do uso do GN em células combustíveis, na produção de metanol e hidrogênio.

As possibilidades de negócios são grandes. Faltam regras claras e um marco regulatório sólido para atrair os investimentos necessários. Falta também construir uma cultura do gás, para fazer desabrochar uma indústria do gás no Brasil. As iniciativas podem começar com os formadores de opinião: universidades, empresários, profissionais liberais.

A matriz energética brasileira continuará a ser particular, com uma excelente participação da energia elétrica de hidrelétricas, pois o Brasil é uma nação privilegiada em sua hidrologia. O GN entra como suporte para este sistema baseado em hidrelétricas.

Entretanto, falta uma política industrial para o país, da mesma forma que houve na era desenvolvimentista. Falta uma definição se o Brasil seguirá como fornecedor de matéria prima eletro-intensiva ou irá se desenvolver com produtos e processos que utilizem quantidades menores de energia.

5. Conclusão

O desenvolvimento industrial e do setor energético no Brasil teve uma profunda influência do governo em atuar como ator principal no desbravamento de vários setores da economia, como siderurgia, mineração, eletricidade, petróleo, indústria de base de um modo geral.

Mesmo no caso mais recente, com a construção do gasbol, a atuação do governo, através da Petrobrás, viabilizou o gás natural como um energético viável e possível para o Brasil.

A maior contribuição que o governo atual pode dar para o desenvolvimento energético como um todo e principalmente do gás natural é ter uma política clara, criar um marco regulatório estável, criar condições para atrair os investimentos externos no desenvolvimento destes setores.

Diversos esforços foram feitos pelo governo para minimizar a dependência do petróleo importado. Porém, estes esforços necessitam ter sinergia entre si. Os diversos programas e fomentos devem se somar e não concorrer uns com os outros. Este erro o governo está fazendo ao direcionar o GNV para a frota de automóveis que usa gasolina e álcool. Desta forma, existe uma correção de rota a ser tomada pelo governo, fomentando o GNV para deslocar o uso do diesel.

Existe uma barreira cultural para a expansão do gás natural no Brasil. Os esforços do governo não devem ser canalizados na construção de gasodutos, mas na regulamentação federal do GNL e GNC; além de fazer parcerias com todas as organizações e instituições formadoras de opinião entre outras, para introduzir a cultura do gás nas faculdades, escolas e prefeituras.

Existe um grande potencial de uso do GN na indústria, deslocando a energia elétrica em processos de produção de calor e vapor, onde o governo poderia fomentar financiamentos para a modernização dos processos industriais brasileiros.

O gás natural é um energético nobre e nobre deve ser seu uso. É um energético que irá ocupar um importante papel na matriz brasileira, quer porque temos reservas significativas, quer porque nossos vizinhos também e também porque é um energético que pode fazer a transição de uma cultura voltada ao uso do petróleo, para outra voltada a combustíveis alternativos, por exemplo o uso do GN em células de combustível.




postado por : francieli

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